
Por Portal TdW
O ano era 2016. A franquia Star Wars, recém-revivida sob o domínio da Disney, estava em plena expansão. Após o lançamento de O Despertar da Força, o estúdio apostava alto em um novo formato: os chamados “spin-offs”, histórias paralelas ao núcleo da saga Skywalker. O primeiro deles, Rogue One: Uma História Star Wars, carregava a missão de conectar diretamente os eventos entre a trilogia prelúdio e a trilogia clássica, mais especificamente entre A Vingança dos Sith e Uma Nova Esperança. E o homem escolhido para comandar esse projeto foi Gareth Edwards.
Conhecido até então por sua sensibilidade visual em obras como Monstros e por ter dirigido o reboot de Godzilla em 2014, Edwards era uma escolha que surpreendeu alguns, mas empolgou muitos. Sua abordagem mais orgânica e sua admiração genuína por Star Wars o tornavam, à primeira vista, o diretor ideal para um projeto tão delicado. E o resultado foi um sucesso estrondoso: Rogue One arrecadou mais de um bilhão de dólares e é amplamente considerado um dos melhores filmes da era Disney.
No entanto, quase uma década depois, o mesmo diretor que entregou uma das produções mais elogiadas da era moderna de Star Wars declarou, com tranquilidade, que não pretende voltar para a franquia. Em entrevista recente à Entertainment Weekly, Edwards afirmou estar “feliz em seguir em frente”. A frase, embora simples, ecoa como um manifesto de liberdade criativa.
Para entender a dimensão dessa declaração, é preciso revisitar não apenas o processo de produção conturbado de Rogue One, mas também a complexa relação entre diretores autorais e as exigências de uma franquia bilionária como Star Wars. Durante a pós-produção de Rogue One, boatos sobre refilmagens extensas e mudanças criativas tomaram conta da imprensa. Tony Gilroy, roteirista de O Legado Bourne, foi trazido para supervisionar o corte final do filme e dirigir novas cenas, o que gerou rumores sobre um possível “rebaixamento” de Edwards. Embora ambos tenham sido creditados oficialmente, o envolvimento de Gilroy levantou questões sobre o verdadeiro controle criativo do projeto.

Na época, Edwards permaneceu em silêncio. Agora, quase dez anos depois, sua postura parece clara. Quando perguntado sobre um possível retorno ao universo Star Wars, ele respondeu com elegância e firmeza: “Estou muito feliz fazendo minhas próprias coisas”. Essa afirmação revela não apenas seu atual foco em projetos originais, mas também um certo alívio por estar distante da pressão e das expectativas titânicas que envolvem uma marca como Star Wars.
E sua fala se torna ainda mais significativa quando observamos seu próximo passo: Gareth Edwards está atualmente envolvido com Jurassic World: Rebirth, um projeto que carrega outra franquia icônica, mas que aparentemente oferece mais espaço para exploração pessoal e narrativa. O diretor parece buscar desafios em universos estabelecidos, mas sempre tentando preservar algum grau de autoria criativa.
A fala de Edwards também se alinha com um padrão cada vez mais evidente entre diretores que passaram por Star Wars nos últimos anos. Phil Lord e Chris Miller, por exemplo, foram demitidos de Han Solo em pleno processo de filmagem por divergências com a Lucasfilm. Colin Trevorrow, inicialmente confirmado para dirigir A Ascensão Skywalker, também foi substituído. Rian Johnson, apesar de ter entregue Os Últimos Jedi, tornou-se uma figura polarizadora, embora tenha mantido bom relacionamento com o estúdio. A recorrência de conflitos criativos evidencia que trabalhar em Star Wars, embora prestigioso, está longe de ser uma experiência puramente autoral.
Talvez por isso, a fala de Gareth Edwards ressoe tanto. Ele não apenas entregou um filme respeitado — Rogue One é frequentemente citado como o mais “pé no chão” de toda a franquia, com uma estética de guerra realista e um tom sombrio que foge da estrutura convencional de heróis — como também se afastou sem ruídos, sem declarações polêmicas, sem mágoas explícitas. Sua saída foi silenciosa, quase tão furtiva quanto a missão suicida de Jyn Erso e seus companheiros em Scarif.
E isso nos leva a um ponto central: o que Rogue One representa para a franquia. Lançado entre episódios numerados, o filme se destacou por sua ousadia em matar todos os protagonistas e por apresentar um tom político mais sóbrio. Além disso, trouxe um dos momentos mais memoráveis de toda a saga: a cena de Darth Vader no corredor, uma explosão de brutalidade e tensão que ainda arrepia os fãs. Gareth Edwards pode não ter dirigido essa sequência específica — rumores apontam que ela foi ideia de Gilroy —, mas a atmosfera do filme é inegavelmente sua.
Quando Edwards diz que está feliz “fazendo suas próprias coisas”, é difícil não sentir uma pontada de nostalgia. Seu estilo visual, sua dedicação à construção de mundos e seu respeito silencioso pela mitologia de Star Wars fizeram de Rogue One algo único. E talvez justamente por isso ele prefira não retornar. Ter deixado uma marca positiva, sem estar atado a futuras repetições ou interferências, pode ser o melhor dos cenários.
Enquanto isso, a franquia segue adiante, com novas séries, animações, livros e produções cinematográficas anunciadas. Tony Gilroy retornou como showrunner de Andor, série derivada de Rogue One que foi amplamente elogiada pela crítica e que reforçou o potencial narrativo de personagens aparentemente secundários. Ironicamente, Andor é considerado por muitos como a produção mais refinada da era Disney, ultrapassando até mesmo The Mandalorian em complexidade política e desenvolvimento de personagens. É uma ironia que reforça o valor do que Edwards ajudou a plantar, mesmo que ele tenha decidido não colher.
Em uma galáxia onde tudo é reaproveitado, revisitado e transformado em franquia, Gareth Edwards opta por seguir em frente. E isso, por si só, já o diferencia. Não porque despreze Star Wars, mas porque compreende que há valor em saber quando uma história chegou ao fim. Para ele, Rogue One foi essa história — completa, impactante, e suficiente.
E talvez isso seja exatamente o que falta a muitas narrativas modernas: a coragem de terminar. Edwards terminou seu capítulo com dignidade e sucesso. E, ao fazer isso, talvez tenha se tornado um dos poucos a realmente entender o que significa “uma história Star Wars”. Não algo eterno por contrato, mas algo que vive em seu tempo, brilha com intensidade… e então se sacrifica, como os heróis de Scarif, por algo maior.
Ainda assim, o legado de Gareth Edwards não se limita apenas a uma decisão de despedida. Seu impacto em Rogue One serviu como catalisador para uma mudança na forma como a franquia poderia ser abordada: com mais maturidade, complexidade e um olhar menos voltado para o épico heroico tradicional. Essa transformação abriu espaço para narrativas como Andor, que aprofunda ainda mais as implicações morais da rebelião e mergulha em temas como radicalização, sacrifício e o custo humano da guerra.
Ao entregar um filme onde os heróis morrem sem glória, mas com propósito, Edwards quebrou o molde da esperança simplificada e introduziu um senso de realismo que poucos imaginavam ver em Star Wars. Esse realismo, longe de apagar o brilho da galáxia distante, a enriqueceu. A dor, a dúvida, o medo e a luta silenciosa tornaram-se mais palpáveis. O público passou a enxergar que a vitória final não veio de grandes profecias ou duelos com sabres de luz, mas da coragem de desconhecidos que sabiam que talvez nunca veriam o fruto de seus atos.

Hoje, enquanto a Lucasfilm se prepara para um novo ciclo cinematográfico — com filmes sobre Rey, o passado Jedi e a Nova Ordem —, a sombra de Rogue One ainda paira. É impossível não perceber sua influência estética, seu ritmo narrativo mais sóbrio e sua paleta emocional mais crua em outras produções. O que Gareth Edwards plantou floresceu, mesmo longe de suas mãos.
Sua escolha por não voltar não é um afastamento — é um encerramento. E, paradoxalmente, talvez seja isso que o eternize entre os grandes nomes da saga. Diferente de outros diretores que deixaram a franquia por conflitos ou fracassos, Edwards saiu em alta, deixando saudade e respeito. Seu silêncio durante anos se converte agora em uma fala clara: fez o que tinha de fazer, e fez bem.
No final das contas, talvez Gareth Edwards tenha compreendido melhor que ninguém a essência do próprio Rogue One: que há missões que não precisam de reconhecimento. Que o verdadeiro impacto está na mudança duradoura. E que a força de uma história está, sobretudo, em saber quando ela termina.
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